Quando minha filha mais velha tinha uns dois aninhos nós morávamos numa casa que a companhia onde meu marido trabalhava na época alugava para nós. Era um bairro muito agradável e atrás da nossa casa tinha um lago bastante grande.
No outono, que na Flórida é quase tão quente quanto o verão, os gansos selvagens começavam a chegar fugindo das temperaturas rigorosas dos estados mais ao norte, onde eles passavam a primavera e o verão.
Minha filha adorava e eu também, é claro. Começávamos a juntar casquinhas de pão. Sabe as beiradas do pão de forma, pois é, eu assumo, sou mãe condescendente, eu cortava e ainda corto as casquinhas do pão de forma para as minhas filhas. Mas lá na Flórida elas eram muito bem aproveitadas no fim da tarde, quando eu saía para uma caminhada ao redor do lago com minha filhota e nós alimentávamos os gansos. Os danados eram tão mal acostumados que lá pelas três da tarde eles já iam aparecendo atrás da minha casa para esperar a merenda. Além dos gansos adultos vinham os filhotinhos atrás das mães, uma graça.
Era uma delícia ver minha pequena toda contente jogando as casquinhas do pão que a gente coletava no café da manhã e da tarde para os gansos, que a gente chamava de pato mesmo.
Ela apontava o dedinho gorduchinho toda feliz e dizia umas duas dezenas de vezes:
– Pato.
E eu repetia:
– É filha, o pato.
Impressionante como mãe acha graça da mesma coisa cem vezes por semana. Acho que durante os primeiro anos de vida das minhas filhas eu baixei pelo menos uns dez pontos no meu QI. Não tenho certeza se por conta de passar o dia todo conversando com crianças ou se pelas horas de sono perdidas.
Voltando a vaca fria, ou melhor, ao pato gordo, tudo ia muito bem, até que um dia chegou um ganso machão no pedaço. Ele era da altura da Giulia e decidiu que só pão não era suficiente, ele queria comer os dedinhos gorduchinhos da minha filha.
A Giulia tinha por habito correr atrás dos patos depois que o pão acabava, e adorava vê-los fugindo dela de volta ao lago. Estávamos as duas encantadas com aquele pato enorme e bonitão, mal sabia eu. Quando acabou o pão e a Giulia se preparava para correr atrás dos patos, ele começou a se aproximar esticando o pescoço na direção das mãos dela.
– Vem mais perto da mamãe, vem.
Disse eu já percebendo as más intenções da ave carnívora, mas ele continuou gingando na nossa direção. Eu muito autoconfiante dei uns dois passos na direção dele e gritei:
– Xô!
Mas quem levou um “Xô!” fui eu, o bicho abriu as asas soltou um granido ameaçador e começou a correr na minha direção. Eu taquei o cesto de pão vazio na cabeça dele, peguei a Giulia com um braço só e saí correndo com o pato louco no meu encalço, por pouco não pego o pescoço dele na porta de correr da varanda. Teria sido muito bem feito! Onde já se viu confundir os dedinhos da minha filhota com minhoca!