“Vestibular” Americano

“Vestibular” Americano – Jovens Brasileiros São Bem Vindos

Não sei como anda o vestibular no Brasil com o Enem, mas estou descobrindo o processo que os jovens americanos enfrentam para entrar numa faculdade nos Estados Unidos com fascinação.

Enquanto no Brasil o sistema é 100% acadêmico, pelo menos era nos meus tempos de vestibular—no fim dos anos 80; nos Estados Unidos usa-se o que eles chamam de Processo Holístico. Não se leva em consideração apenas o resultado de testes, mas sim o conteúdo de dissertações sobre temas da atualidade, e outras de conotação pessoal do tipo: “Por que você acha que essa é a universidade certa para você?” Também são solicitadas cartas de recomendação, e detalhes sobre suas atividades extracurriculares. Bons atletas, músicos, bailarinos, cantores, atores, escoteiros, etc. devem expor estes aspectos de suas vidas. Atletas são particularmente bem vindos, chegando a receber bolsas de estudo integrais. Jovens músicos que tocam instrumentos clássicos como violino, viola, oboé, etc. também são bastante cogitados, dependendo da sua habilidade. Sem falar em intermináveis questionários online onde entram-se detalhes da vida inteira.

Outra diferença bastante interessante refere-se aos testes. No Brasil, no meu tempo, para cada universidade (university) ou faculdade (college) o jovem precisava passar por uma bateria de testes. Se você quisesse tentar entrar em 8 (oito) faculdades, tinha que participar de 8 vestibulares, ou prestar 8 vestibulares, e tinha que passar por 8 testes diferentes, sendo que alguns deles envolviam mais de uma fase. Nos Estados Unidos, os jovens escolhem entre dois testes padronizados, o SAT e o ACT (ambos oferecidos por companhias independentes), sendo que faculdades de elite (chamadas Ivy League, como Harvard, Yale, Princeton e Stanford entre várias outras), e de ciências exatas em geral, exigem o ACT. Além destes testes que cobrem inglês, matemática, e análise de dados, também são oferecidos testes específicos para matérias como química, biologia, física, história, e idiomas estrangeiros. A grande vantagem deste sistema é que os jovens fazem testes relacionados aos seus interesses. Assim, se o objetivo é entrar numa faculdade de engenharia, não é necessário fazer teste de história, por exemplo. Os jovens fazem os testes que enriquecerão seus currículos de acordo com as faculdades para as quais querem se inscrever. E usam os mesmos resultados para todas elas. É bastante prático. Faz-se os testes, e no website da empresa que os organiza marca-se as faculdades e/ou universidades para as quais se pretende “prestar”, e todas recebem formulários pelo correio no seu nome, com os seus resultados.

Outro aspecto que eu estou achando muito bacana sobre esse sistema é que respeitando-se um intervalo, que varia de acordo com o teste, pode-se repetir os testes quantas vezes se desejar. Por exemplo, se o resultado do ACT na primeira tentativa oficial não foi satisfatório, tenta-se de novo em alguns meses. As faculdades que estão na sua lista verão todos os resultados, mas dentro de um certo número razoável de tentativas (digamos no máximo três num período de um ano), elas apreciam o esforço dos jovens em estudar, e registram seus melhores resultados em cada matéria, e em cada teste, no processo final de avaliação. Isto sem contar a chance de se fazer os testes nas datas oficiais sem que se registrem os resultados oficialmente, estes são chamados testes preparatórios ou Prep-SAT (PSAT), por exemplo. Pode-se fazer Prep-Tests para todas as matérias nas datas oficiais, basta marcar a opção prep na hora da inscrição. Alguns jovens começam a fazer pre-tests na oitava série para saber em que matérias eles precisam se dedicar mais e para quais matérias eles tem uma aptidão natural.

Pronto, fácil fácil, basta ter excelentes notas que todo o mundo fica sabendo.

Currículo, porém, é a palavra-chave. O processo americano mais parece o de construir um currículo vitae onde os jovens descrevem capacidade intelectual, interesses, habilidades e experiências de vida. Não basta, de longe, ser bom aluno e se sair bem nos testes padronizados, tem que ter algum talento especial ou interesse ao qual se demonstra compromisso de anos, e alguma estória de vida para contar.

Vamos começar com o tal do interesse, é por aí que se começa a compreender a verdadeira obsessão dos pais americanos com associações, voluntariado, clubes esportivos de bairro, artes, etc. etc. Como dizemos no Brasil, é de pequenino que se torce o pepino, pois é, gracinhas a parte, é logo entre 4 e 6 anos que as crianças americanas, de pais bem informados, começam a praticar esportes como natação, futebol americano (aquele que se joga com as mãos) e o nosso tradicional de bola no pé que aqui chama-se soccer (daí o termo, tradicionalíssimo, soccer-mom – mãe que leva filho para cima e para baixo por conta de atividades extracurriculares), balé, tênis, reuniões de escoteiros, coral musical, orquestra, banda, clube de xadrez, de debate, de soletrar, de desenhar, de inventar (falando sério, chama-se “makers” ou uma variação de criadores em inglês, começa com lego e vai ficando cada vez mais sofisticado até chegar a robótica, tem até robô de lego), enfim, as opções são inúmeras. Isso é bacana, pois existem atividades para todas aptidões e personalidades, mas por outro lado, pode ser bem complicado para se decidir ao que se dedicar. Todos sobrevivem, porém, e após alguns anos batendo cabeça entre várias atividade, lá pela sexta série, a primeira do ginasial (middle school) as crianças com alguma aptidão particularmente especial já foram identificadas. Tipo aquele molequinho que logo na terceira aula de natação já colocava duas piscinas na frente dos coleguinhas, pois é, acontece mesmo que eu vi, ninguém me contou. As outras crianças que não nasceram com guelras, também já descobriram que curtem ser escoteiras, ou voluntariar no banco de alimentos da cidade, ou desenhar, dançar balé, tocar violino, etc. Se o jovem é absolutamente fantástico em alguma coisa, pode ser que consiga uma bolsa de estudos pelo menos parcial. Mesmo que esse não seja o caso, se a atividade que se gosta for levada com compromisso e seriedade, tipo voluntariar por uma ou duas horas toda semana por anos (algumas escolas, e com certeza os pais, ajudam as crianças a encontrar organizações adequadas para cada idade), o resultado é uma estória de dedicação que fica muito bonita no currículo dos jovens vestibulandos.

Ótimo, você diz, entendi tudo: boas notas no histórico escolar, boas notas nos testes padronizados, e alguma atividade, ou com sorte talento atlético ou artístico, beleza, peguei o jeito da coisa. Ainda não.

Agora vem o detalhe que fecha o currículo ideal, a tal experiência de vida. Por favor, me diga, que experiência de vida para contar tem o jovem de dezessete-dezoito anos, de classe média, numa sociedade relativamente segura, e que cresceu protegido pelos pais? E esse é o grande mistério das dissertações para se entrar nas faculdades e/ou universidades americanas, e que faz com que o processo seja um tanto turvo. Minhas filhas não terão problemas nesse quesito. Através da nossa vida de nômades elas viveram em três continentes, e mudaram de escola tantas vezes, que têm estórias para contar até demais. Porém, tenho muitos amigos americanos cujos filhos não conseguem entrar nas faculdades que gostariam por conta desse fator. A boa notícia para os brasileiros é que o ser brasileiro conta como algo interessante para se explorar numa dissertação. Portanto, jovens brasileiros estudiosos e talentosos, não se acanhem, as universidade americanas estão interessadas em vocês. Se você fala inglês fluentemente e tem condições de bancar os custos de tal empreitada, suas chances de entrar na faculdade americana da sua escolha, incluindo “Ivy League”, são maiores que as chances dos jovens americanos de classe média. Mas se você pensa em estudar no exterior, deveria considerar também a Alemanha que recebe estudantes fluentes em inglês com boas notas, e oferece curso universitário gratuito para estrangeiros.

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Paulistano em São Francisco Sente-se em Casa

De Volta ao Caos Urbano na Baía de São Francisco

De Volta ao Caos Urbano na Baía de São Francisco

Após vários anos vivendo em subúrbios americanos super tranquilos na Flórida e na Georgia, mudei para a Baía de São Francisco na Califórnia. Estou de volta ao caos urbano.

       Transito, com direito a buzina, palavrão (sendo jerk, uma versão chula de idiota em inglês, o mais suave), e claro, gestos obscenos. Ah, e multas, coisa que não fazia parte da minha vida há muitos anos;

       Poluição, já faz duas semanas que apesar do frio não se pode acender lareira tradicional, sabe, do tipo que leva pedaços de madeira. Só quem tem o sistema a gás pode usar a lareira até sairmos do vermelho no índice de poluição atmosférica local;

       Pedintes nas esquinas, e sem teto vivendo em barracas de acampamento nos parques (se bem que para os padrões brasileiros tem sem-teto aqui até que bem equipado, mas também tem aqueles que dormem sobre papelão nas calçadas). Pelo menos não se vê crianças pedindo nas ruas;

       Filas enormes para pagar compras no supermercado, isso eu não enfrentava desde Xangai;

       Achar lugar para estacionar é um parto. Até os estacionamentos lotam, e há que se rodar para encontrar uma vaguinha apertada. Fazia anos que eu não precisava estacionar na paralela tanto quanto em São Francisco;

       Esperas absurdas nos restaurantes;

       Filas em postos de gasolina, juro;

       Custo de vida altíssimo, começando pelo preço do combustível, que na Califórnia é o mais alto dos Estados Unidos, tudo aqui é um absurdo. Os imóveis são ridiculamente caros, alugueis, escolas particulares, alimentos, enfim, somente os itens de consumo como eletrônicos, brinquedos, e roupas seguem os padrões que os brasileiros normalmente encontram no restante do país;

       Filas espetaculares no pedágio para atravessar a ponte “Bay Bridge” de Oakland para São Francisco, sabe quando a gente vai para o litoral em feriado, em fim de semana de jogos e shows grandes na cidade, fica daquele jeito, sem brincadeira, é de desanimar;

       Serviço público de qualidade duvidosa. Nem acreditei no atendimento que recebi num posto dos correios aqui perto de casa. Me senti em São Paulo;

       Correria insana, todo mundo está sempre correndo para lá e para cá num vai e vem incessante;

Enfim, estou me sentindo paulistana de novo. O stress está aumentando, a paciência acabando, e aquele jeitinho tranquilo que a gente adquire após anos vivendo em ambientes bucólicos (tipo cidadezinha do interior), está aos poucos sendo substituído por um certo ar de determinação, e aquela atitude de sai-da-frente-que-atrás-vem-gente, que todo habitante de grande metrópole conhece bem.

Contatos de Emergência

redphone

Vida de expatriado tem muitos desafios, mas um dos mais complexos é o tempo que levamos para estabelecermos relacionamentos sólidos. Relacionamentos sólidos para mim são aqueles de confiança, do tipo:

 

– Posso por você na lista de contatos de emergência da escola?

 

E é claro que este tempo varia de acordo com o lugar para onde nos relocamos. Por exemplo, estou na Califórnia há pouco mais de quatro meses e ainda não tenho contatos de emergência. Somos meu marido e eu para segurar todas as barras, quando ele está perto o suficiente, senão somos eu e Deus, como dizemos no Brasil.

 

As vezes damos sorte e pinta um “rapport” com um vizinho, outras vezes a cultura do lugar ajuda. Na Georgia, logo no primeiro dia de aulas das crianças conheci uma mãe enquanto esperávamos o ônibus escolar na esquina de casa. Quando eu disse que havia mudado para lá havia poucas semanas e ainda não tinha sequer um conhecido para colocar na lista de emergência da escola, ela imediatamente me ofereceu seu número. Ela também era expatriada, e apesar de haver mudado da Índia para os Estados Unidos fazia anos compreendeu imediatamente minha situação. Somos grandes amigas até hoje. Ela me apresentou aos vizinhos, e duas outras famílias se colocaram a disposição para qualquer situação inusitada, como estar num consultório médico porque uma criança se acidentou, e alguém precisa ir buscar seu outro filho na escola, e ficar com ele por algumas horas. Seu marido está do outro lado do atlântico, ou pacífico, ou qualquer outro oceano, em viajem de negócios, e não dá para contar com ele. Já passei várias situações assim.

 

Aqui na Califórnia as pessoas parecem ser mais reservadas, informais sim, porém cautelosas. E apesar de haver jogado um verde, mencionando de passagem como acabamos de chegar e ainda nem temos os tais contatos de emergência, ninguém se ofereceu para o posto. Já perguntaram se minha filha mais velha, que tem quatorze anos, se interessaria em trabalhar de baby-sitter, mas o tal contato de emergência nada. Não estou tão desesperada porque minhas crianças já sabem ficar sozinhas em casa, mas ainda assim, estou torcendo para encontrar alguém que se candidate o quanto antes.

 

Meu Primeiro Dia de Ação de Graças “Americano”

Apesar de eu ter mudado com meu marido para os Estados Unidos em Dezembro de 1997, durante nossos primeiros seis anos no país vivemos na Flórida, onde a maioria dos amigos que fizemos eram latinos. Portanto, nossos Dias de Ação de Graças eram passados entre mexicanos, cubanos, porto-riquenhos, etc., numa mistura de culturas e tradições familiares diversas. Sim, era servido peru assado, mas com sabor de América Latina. E os acompanhamentos variavam de “guacamole” e “feijões refritos” a “torta de choclo” e “plátanos”. E como todo latino é exagerado, não ficávamos só no peru, não, alguém trazia um pernil assado, e sempre havia “arroz com pollo” e umas “papas rellenas”. Somente quando nos mudamos para Atlanta em 2006, foi que eu participei do meu primeiro jantar de Thanksgiving tradicional americano.

Na mudança para Atlanta contamos com o apoio de um velho amigo do Flavio, que muito gentilmente, nos preparou uma pasta com informações sobre a região onde moramos. E assim que chegamos ele e sua mulher nos convidaram para um brunch em sua casa. Quando chegamos fiquei encantada com o capricho da nossa anfitriã, estava tudo tão lindo. Já havia frutas, em camadas com iogurte e cereais, servidas em taças de cristal sobre a mesa, que ela havia decorado com toalha bordada, porcelana fina e talheres de prata.

A minha filha mais velha tinha sete anos e a pequena apenas três. Você acha que eu consegui relaxar para desfrutar daquilo tudo? Claro que não. Eu fiquei em cima delas durante toda a visita, pois como o casal já tinha os filhos adultos, e nenhum neto ainda, além da mesa elegantemente servida, toda casa era muito bem decorada com lindos objetos sobre todas as mesinhas de centro e canto. Lembro de passar boa parte do tempo caminhando atrás da pequena, enquanto mantinha o ouvido na minha mocinha que conversava animada com a anfitriã, mas no fim tudo deu certo, ambas portaram-se bem, e eu voltei para casa aliviada.

Retribuímos o brunch com um jantar simples, porque nossa mudança foi entregue pela metade, e o segundo container só chegaria em três meses, pois havia sido enviado para a China por engano. Eu conto essa estória em outro artigo. No momento basta dizer que eu retribui um café da manhã servido em porcelana e cristal, com um jantar servido em descartáveis, porque meu marido insistiu que não podíamos deixar passar muito tempo sem retribuir a gentileza deles. Em minha defesa, preciso salientar que fiz o que pude. O importante é que durante o jantar aqui em casa, nós fomos convidados para o jantar de “Thanksgiving” na casa deles. E eles perguntaram para a minha mocinha se ela gostava de peru. E a fofa disse:

– I love turkey. Eu amo peru.

Assim mesmo, nos dois idiomas, bem enfática.

Pelo cuidado que eles tiveram quando serviram o brunch, imaginei como seria o jantar de Thanksgiving na casa deles, e mesmo assim me surpreendi. A decoração da casa havia sido incrementada com detalhes outonais, e móveis tinham sido remanejados para acomodar uma mesa gigante em forma de T que ocupava todo o espaço da ampla sala de jantar. E a família inteira deles estava presente, todos muito simpáticos, e adultos, nenhuma outra criança além das minhas meninas. Ninguém para nos solidarizarmos nos momentos embaraçosos.

A primeira coisa que nossa anfitriã disse após as apresentações de praxe foi:

– A Giulia adora peru. Venha Giulia, vou te mostrar seu prato favorito.

E lá estava, sobre a ilha da cozinha, o peru assado, pronto para ser servido.

A fofa não decepcionou, passou as mãozinhas sobre a barriguinha, fez carinha de entusiasmo e disse:

-Estou morrendo de fome.

Aguardamos a chegada de um casal de sobrinhos e então nos pusemos a transportar travessas de acompanhamentos típicos à mesa, purê de batatas e batatas doces assadas, gravy, legumes sauté, geleia de cranberry, cestos de pães, e o famoso peru. Quando fomos nos sentar, descobrimos que haviam nos dado a base do T, com dois banco altos para as meninas na ponta, o Flavio e eu, um de cada lado delas, tudo muito prático e bem pensado para cuidarmos das pimpolhas. Nessa disposição, a Giulia ficou bem de frente para o casal que sentou-se no meio da mesa do lado oposto de onde estávamos.

Nosso anfitrião levantou-se, destrinchou o peru e todos começamos a passar os pratos de mão em mão servindo o que estivesse a nossa frente na maior animação, tipo jantar em família, até que todos tivéssemos um pouco de tudo a nossa frente. Foi feita uma oração em agradecimento as nossas bençãos e começamos a comer. A Giulia atacou o purê de batatas com entusiasmo, e num destes momentos mágicos, onde várias coisas acontecem ao mesmo tempo, e precisamente quando não deveriam, a mesa ficou em silencio com todos mastigando, ela provou o peru, e nossa anfitriã perguntou em voz alta para ser ouvida desde o outro lado da mesa:

– Você está gostando da comida Giulia?

E ela respondeu igualmente em voz alta, praticamente gritando:

– O purê está bom, mas eu não gostei do peru não, eu prefiro o da minha mãe.

Geleia de Cranberry

Caro leitor(a), acho que fiquei da cor da geleia de cranberry.

Americanos gostam de filés bem grossos e mal passados, eu não.

Não gosto de carne mal passada, DE JEITO NENHUM! Imagina só minha surpresa, quando logo que chegamos a Flórida, em nossa primeira mudança internacional, no primeiro jantar em casa de americanos – que deixe-me ressaltar, adoram aqueles filés de contra, com osso, bem grossos, e sangrando – meu marido ao ser questionado como preferia seu filé respondeu ao anfitrião:

– Eu prefiro entre ao ponto e bem passado, mas a Adriana adora carne mal passada.

Que amor de pessoa! Ele não queria encarar a carne crua, mas não queria fazer desfeita ao colega de trabalho. Então, quem foi para a berlinda? A mulher! Vê-se logo que já éramos casados havia alguns anos.

Fazer o que? Tive que encarar. Acho que nunca fui a um jantar mais desafiante, nem os banquetes chineses, que eu viria a conhecer anos mais tarde, me deixaram tão desgostosa. Deve ser por causa do baijiu.

Logo que chegamos fiquei encantada com a decoração de Natal da casa. Era começo de dezembro e eu nunca tinha visto nada remotamente parecido. Papai e Mamãe Noel na porta, guirlandas por todos os lados, fitas nos balaústres da escada, arranjos com velas em todas as mesinhas de canto e aparadores, e o mais impressionante, apesar do exagero, tudo era de bom gosto, e o conjunto me fez pensar que estava na casa do Papai Noel, lá no Polo Norte. O mais interessante é que o anfitrião era um americano fofinho de bochechas cor de rosa, só faltou a barba para completar o quadro.

O casal nos convidou para sentar na sala de estar e nos ofereceu um petisco. Um “dip” de espinafre, que hoje em dia eu faço em casa. A palavra dip significa literalmente mergulhar. Dips são molhos variados que acompanham salgadinhos e bolachinhas. Você pega a batata chips por exemplo, e mergulha num dip de queijo, coisa pouco calórica, sem dúvida, mas que é gostoso, isso é.

Dip de Espinafre

Pois bem, ficamos sentados na sala beliscando fatias de baguette acompanhadas de dip de espinafre por duas horas. Façamos a matemática da fome, eu havia almoçado um pequeno sanduiche sozinha em casa a uma hora da tarde, nós chegamos na casa deles, conforme o convite, as oito horas da noite, e ficamos jogando conversa fora por duas horas na frente de um potinho de sobremesa de dip e outro de fatias de baguette. Se somarmos todos estes fatores chegaremos ao resultado: fome de três dias. E detalhe, o tema principal da conversa foi como eu falava inglês tão bem, que eles nunca haviam encontrado brasileira que falasse inglês como eu. O que até ajudou um pouco com a fome, pois eu fiquei mordendo a língua para não responder que eu era uma mutante, pois na verdade no Brasil, a gente ainda anda nu pelas ruas e só fala tupiniquim ou espanhol.

Chegou um momento, que meus pensamentos irônicos não deram mais conta de distrair meu estomago colado nas costas, e perguntei, assim como quem não quer nada:

–       Vocês costumam jantar tarde assim todos os dias?

–       Não, nós jantamos as oito. Vocês estão com fome? É que nós fomos jantar em casa de Argentinos, e notamos que vocês costumam comer tão tarde.

O marido da fofa, que trabalhava com meu marido havia anos, percebendo a gafe tratou de esclarecê-la:

–       Meu bem eles são brasileiros, não argentinos.

–       Ah…

T-bone Steak

Finalmente fomos para a cozinha onde nossa anfitriã pegou um pacote de vagem congelada do freezer e colocou no micro ondas. Então fomos todos para o pátio onde nosso anfitrião nos mostrou sua churrasqueira todo orgulhoso. Churrasqueira aqui chama-se “grill” e é a gás. Ele então nos mostrou os T-bone steaks e acendeu o grill. Após uma elaborada apresentação, onde ele nos deixou saber que aqueles eram steaks especialíssimos, e que o certo era comê-los o mais mal passados possível, para saborear as nuances da carne, e que todas as vezes que ele foi ao Brasil ele achou que nós brasileiros ressecamos demais a carne, veio a declaração do meu marido que eu adorava carne mal passada. Show!

Eu voltei para a cozinha com a dona da casa pensando que ela iria refogar a vagem com algum molho qualquer, e qual não foi minha surpresa quando ela tirou o pacote plástico do micro, rasgou, despejou a vagem semi-cozida num prato, e levou para a mesa de jantar lindamente posta. Daí ela pegou outro pacote plástico da geladeira, abriu e despejou umas folhas de salada numa tigela, e levou também para a mesa. Pronto, ela avisou ao marido que o jantar estava servido.

Ele então trouxe os filés para a mesa como se fossem suflês preparados por um chef do Le Cordon Bleu, colocou o de cada um nos pratos a nossa frente, e voilà!

Se você somar a fome, a vagem crua e a salada mal apresentada, o filé sangrento acabou sendo comido com relativa facilidade.

Naquela noite eu aprendi o que é um churrasco americano, e a nunca ir a casa de estrangeiros que você não conhece bem, sem forrar o estomago antes. Ah, e meu marido dormiu na sala uns três dias.

Poligamia

Nos Estados Unidos a poligamia é praticada livremente por membros fundamentalistas da religião Mormon. Apesar desta prática ser contra as leis americanas, eles dizem que ela faz parte dos seus direitos de exercer livremente suas crenças religiosas. A liderança da religião condena a união de um homem com várias mulheres, e chega a excomungar quem segue praticando valores fundamentalistas. Já os fundamentalistas criticam os Mormons que seguem as novas regras estabelecidas em 1890. Eles dizem que esta não foi uma decisão baseada nos valores da religião, mas sim na aceitação da pressão da sociedade em geral. Hoje nos Estados Unidos, os Mormons são mais de 14 milhões, 20 mil deles se autodenominam fundamentalistas, e estima-se que 15 mil ainda pratiquem a poligamia. De um jeito ou de outro, os seguidores da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias ainda são estigmatizados pela sociedade, por ter suas raízes vínculadas a este costume.

O tema controverso atrai telespectadores, e dois shows já foram produzidos para a TV. O fictício Big Love – Grande Amor, mostra a relação de um Mormon poligamista com suas três mulheres. E o chocante Sister Wives – Esposas Irmãs, é um reality show sobre uma família onde um homem é casado com três irmãs.

Ano passado os Fundamentalistas da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias tiveram que parar e rever certas liberdades “religiosas” quando o “profeta” Warren Jeffs foi preso por estupro e pedofilia. Condenado a prisão perpétua ele segue tentando controlar seus 10.000 seguidores que vivem em duas cidades vizinhas na divisa entre Utah e Arizona. No fim do ano passado, de dentro da cadeia, ele enviou ordens à sua comunidade mormon fundamentalista para que todos parassem de fazer sexo. Em junho deste ano ele emitiu nova ordem dizendo que 15 homens, que Deus escolheu, devem ser os pais das novas gerações da comunidade. Os maridos devem parar de ter relações com suas esposas, que devem ficar disponíveis a estes 15 homens. Os maridos serão simplesmente responsáveis pelo sustento e pela criação das novas gerações. As autoridades dizem que este é um gesto desesperado de Jeffs, para manter sua relevância entre os fundamentalistas, mas surpreendentemente dentro da comunidade seus seguidores continuam acatando suas ordens.

Quando cheguei aos Estados Unidos e tomei conhecimenbto da existência destas comunidades onde a lei e a justiça dão lugar ao fanatismo, e onde abusos como estes levam anos para serem investigados e processados, e bandidos como Jeffs seguem dando ordens absurdas de dentro da prisão, fiquei chocada. Imaginem minha reação ao ler o artigo da BBC Brasil hoje sobre “união estável de três“. Seria interessante que a tabeliã da cidade de Tupã se familiarizasse com as ramificações de suas declarações:

“O fato de eles viverem de tal jeito não afeta a minha vida, é a liberdade privada deles. Gostaria que fosse muito simples: você vive como quer, do jeito que quer, não afeta a vida dos outros, e ninguém tem que se intrometer. Mas a realidade no Brasil, como nós sabemos, não é essa”, diz a tabeliã de Tupã.

“No Brasil ainda se pensa muito de forma individual. Se algo não é bom para mim, não é bom para ninguém. Tudo bem, eu continuo não querendo para mim, mas eles não me afetam, vivendo em três, ou em cinco. Agora me afetam, por exemplo, quando fazem de conta que têm um casamento maravilhoso mas têm dois amantes, três amantes. Isso me afeta, fazer de conta que não sei”, complementa.

Ver uma tabeliã pensando exclusivamente em seus valores pessoais e não como uma relação destas pode afetar suas vítimas, como as crianças, fruto de tais relações, assim como as jovens forçadas, muitas vezes por falta de recursos, a tais relacionamentos, me chocou tanto quanto as comunidades fundamentalistas Mormons.

Para quem lê em inglês este ótimo artigo “Is Sister Wives hiding the disturbing truth about polygamy?” oferece alguns pontos para reflexão. Neste texto, Sam Brower, que é detetive particular e fez sua carreira ajudando vítimas das Comunidades Fundamentalistas da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias fala, não apenas das meninas vítimas de abusos, mas dos meninos que ao atingirem a adolescência passam a ser considerados concorrentes dos homens com várias esposas adolescentes, e são banidos das comunidades. Qualquer semelhança com animais irracionais, que mantém várias fêmeas, e matam os concorrentes, não é mera coincidência.

Um Primeiro Dia da Escola memorável

Há duas semanas começou o ano letivo no Estado onde moro. Esse início de aulas me fez querer compartilhar com meu(s) leitor(es) minha experiência de início das aulas no ano passado, quando meu filho foi para o 1o. ano da escola.

Da minha infância lembro-me que estava de uniforme novo, todo arrumadinho e limpinho, mochila nova, cabelo penteado e, ao sair de casa, minha mãe tirou uma fotografia. E só. E talvez me lembre porque vi a fotografia tempos depois! Eu fui para a escola não lembro como, ela foi trabalhar e meu pai já estava no trabalho como qualquer outra segunda-feira.

Aqui a passagem da pré para a escola primária (ou ensino fundamental, como se chama hoje no Brasil) é bem diferente. As crianças que irão para a escola entram num programa especial do Kindergarten (creche) que as prepara para a vida escolar. Uma série de atividades internas e passeios são programados, inclusive um pernoite de despedida no Kindergarten!

Além disso, entram no programa a visita na nova escola. Na matrícula a criança está presente. Há também uma avaliação psicológica e pedagógica na creche e uma outra de saúde feita por um pediatra especializado. Não passa nada despercebido!

Outra sensação é a mochila escolar. Como tudo aqui, tem que ser aprovada pelos órgãos de proteção ao consumidor, obedecer a critérios técnicos e de ergonomia e ainda ser capaz de resistir por 4 anos chuva, barro, neve, chutes, peso e todo tipo de agressão que se possa imaginar. E ainda, se possível, passar para o irmão mais novo! Conclusão: nunca achei que fosse gastar tanto com uma mochila da escola!

E então, tendo sido aprovada em todos os testes, comprado a mochila e a matrícula confirmada pela escola, chega o grande dia! O dia da iniciação escolar!

É um dia tão especial que nem acontece na segunda-feira, mas na terça-feira.

Logo de manhã as crianças ganham um cone fechado em cima (às vezes uma de cada membro da família) cheia de doces, brinquedos e, claro, algumas coisinhas mais educativas, como livrinhos, canetinhas, etc). Essa história do cone eu incorporei, pois desde que moro aqui vejo-as por todo o comércio nessa época do ano. Mas mãe que é mãe (e prendada) confecciona-o manualmente! Não cheguei a tanto, por sorte o Gabriel escolheu uma de dinossauro, prontinha… ufa!

Então todos se reúnem na igreja para um culto ecumênico com os iniciantes e seus familiares. Em seguida todos seguem para a escola, onde são recebidas com uma festa  organizada pela diretoria, corpo docente e as crianças da 2a. série. Após a recepção, cada uma encontra sua professora e são encaminhadas junto com os colegas para a sala de aula.

Beleza, pensei, eu vou acompanhar isso tudo! E os avós também!

Aí é que tomei um choque! No que chego na igreja, percebo que os outros alunos estavam com TODA a família presente. Aí descobri que o pai também tira o dia de férias para acompanhar o rebento no primeiro dia da escola. Aí vem os tios, padrinhos, avós, irmãos, amigos mais próximos da família, cachorro (no Brasil incluiria-se o  papagaio, galinha, porco, etc).

Nós nem pensamos nisso! E é uma coisa tão “óbvia” para eles que nem se comentou em conversas. É subentendido… Coitado do meu filhinho… o único “sem pai” no primeiro dia da escola… Se já não tivesse acostumada com a ausência dos membros da família em outras ocasiões, isso seria uma tragédia mesmo. Ainda bem que os avós estavam lá!

Passado o alvoroço todo, as famílias alemãs se reúnem mais uma vez no dia para uma festa particular. Pode ser um churrasco ou uma janta especial no fim do dia. Pra fechar com chave de ouro! Parece batizado… Nós fomos para o grande M amarelo comemorar. Para o pequeno foi realmente uma festa levar sua família para lá.

Mas será que a vida escolar é tão ruim assim pra ser vendida tão “cara” às crianças? Ou elas precisam desse ritual para sentirem que alguma coisa muito importante está acontecendo?

De qualquer forma, essa iniciação escolar ficou em nossas memórias como um momento muito mais especial do que imaginávamos!

Sua nudez não será castigada!

Viajar de férias é uma das melhores coisas a se fazer na vida. Seja para onde for, sempre há muito o que observar. Dessa vez vou compartilhar com meus leitores uma peculiaridade das praias espanholas que para mim, como brasileira, chamou muito a atenção: a nudez nas praias.

A primeira vez que fui à uma praia espanhola, há 4 anos, foi na ilha de Fuerteventura. A ilha tem inúmeras praias, algumas mais habitadas, outras desertas, algumas com ondas gigantes, outras com água calma e cristalina, como se fossem piscinas naturais. Um paraíso na Terra certamente.

Pois bem, escolhemos nossa praia de destino, arrumamos nossa tenda para um belo dia de verão na praia.. Quando olho em volta, uma porção de gente sem roupa! Homens e mulheres nus ou de topless à beira-mar. Eu conheço certas pessoas que essa situação causaria, no mínimo, um ataque de risos….

Não esperava ver nudez numa praia bem frequentada por pessoas não-nuas, mas enfim, depois de morar alguns anos na Alemanha ouvindo histórias sobre saunas mistas em família e vendo pessoas trocarem suas roupas de banho em pleno lago lotado à luz do dia, certas coisas não me deixam mais embaraçada.

Curtimos nossos dias de praia e nos deparamos algumas vezes com peladões e mulheres de topless, apesar de haver praias de nudismo na ilha. Pensei que a ilha paradisíaca inspirasse essa liberdade nas pessoas…

Dessa vez fomos à várias praias na Espanha continental, no litoral do Atlântico e no litoral Mediterrâneo. Fomos a praias de cidade e afastadas. Fomos de Guarujá-Pitangueiras à Ilha Bela na alta temporada, se é que você me entende… Praia de surfista, de “bicho-grilo”, de família, de solteiros, de gente que quer sossego. E em todas elas encontramos gente nua ou sem a parte de cima dos biquínis… Eu comecei a observar as pessoas que estavam nuas, não para olhar a nudez em si – afinal eu sei exatamente o que cada um tem – mas para descobrir que tipo de gente tem a coragem de mostrar seu corpo assim, pra todo mundo?

Descobri que eram pessoas como eu, como você, como minha mãe ou pai, ou avó, ou tia, ou tio, ou primo, ou prima…. Famílias chegam com seus aparatos de praia, as crianças pegam o baldinho e a pá para brincar, o pai vai jogar bola com o filhinho e a mãe, o que faz? Tira o sutiã!!! Normal, não? Deve ser uma sensação interessante estar sem sutiã num lugar onde há pelo menos 100 pessoas em volta que você nunca viu na vida…

A cena mais curiosa, pra não dizer engraçada, foi nosso primeiro dia em San Sebastián. Estávamos caminhando na praia a caminho do centro para jantar e, de repente, um homem peladão saindo do mar passa por nós. Era um homem de meia idade, barrigudo e peludo, na maior naturalidade.  E então ele se deita na areia, ao lado de um amigo, que não estava nem de roupa de banho, e começam a conversar: “Que banho de mar delicioso! Você viu a notícia do jornal de hoje?”. Imagine um brasileiro fazendo isso?

Como pode o espanhol ter uma relação com a nudez tão aberta e nós, o país onde todo mundo anda quase pelado no Carnaval e termos os menores biquinis do mundo, sermos tão conservadores? É uma questão que me deixa por vezes confusa. E é talvez por isso que os estrangeiros, melhor dizendo, os europeus acham que seria de se esperar que nós tivéssemos uma abertura maior em relação a isso.

Quem sabe da próxima vez eu me animo e entro na onda? Na Espanha minha nudez certamente não seria castigada…

Churrasco alemão: Tudo O Que Você Precisa Saber

Feriados, Eurocopa, verão, férias! Essa é a época ideal para falar sobre mais uma paixão que os alemães compartilham conosco: o churrasco ou grill, como eles chamam! Estando em outro país, outra cultura, outro clima, nota-se as diferenças entre o modo de preparo e os ingredientes usados aqui e no Brasil.

Para nós, brasileiros, e para eles qualquer motivo é motivo para “queimar um cebo”. A diferença é que o fato de podermos fazer-lo em qualquer época do ano, faz até ficar um pouco comum demais…

Churrasco é uma festa!

Na Alemanha teoricamente só é possível fazer churrasco de abril a setembro (quando dá sorte de não chover muito), o que faz o “Grill” ter um sabor especial. Exceção foi um Natal que tivemos “amenos” 12 graus e vizinhos nossos fizeram um churrasco de Natal!! Claro que comeram no aconchego de sua sala de jantar, mas só o fato de poder assar a carne ao ar livre já foi uma sensação! E eu nem tive essa idéia…

Bem, churrasco alemão tem que ter quatro componentes: salsicha, carne, salada e pão.

Salsicha existe de inúmeros tipos: de porco, de boi, de carneiro, de frango. Com ervas, sem ervas. Com queijo. Com pimentão. Crua. Defumada. E sempre há vários vidros de molho pronto para acompanhar (catchup, mostarda, alho, curry, e muitos outros). A minha preferida, contudo, continua sendo a linguiça tipo calabresa com erva-doce que encontro no supermercado italiano da cidade…

A carne de porco é a preferida, seguida de frango, boi e... legumes!

Carne é basicamente carne de porco, mas pode ser de frango, peru, peixe… Os steaks (bifes) e barriga de porco (enrolada no espetinho, nunca tive coragem de provar, mas dizem que é bom) são as preferidas DELES.

Os bifes são vendidos marinados nos supermercados ou açougues. Explicando: marinar significa misturar temperos e sal com um meio fluido e gorduroso e embeber a carne nessa mistura por alguns dias. No caso dos bifes de porco, frango e peru faz todo o sentido, pois são carnes que são difíceis de pegar tempero. Então é necessário temperar – e bem! Normalmente eles usam misturas de ervas, pimenta do reino, pó de pimentão… Ultimamente tem aparecido frango no tempero de curry que é até gostoso.

Alho nem pensar! Fato é que os alemães temem o odor que é produzido quando se come alho… Mas esse é outro assunto.

Acompanhamentos complementares são salada e pão. Salada é uma obsessão do povo aqui. Uma mania que eu até incorporei aos meus churrascos, porque são realmente práticas (podem ficar a tarde toda em cima da mesa, sem precisar esquentar) e fornecem um complemento saudável ao prato de carnes. Imprescindível é uma mesa com vários tipos de salada ou até um bufê, quando o evento é maior. Esqueçam as saladas de maionese que aparecem nesses eventos no Brasil. As de batata, macarrão, folhas, repolho, pepino e cenoura são as tradicionais por aqui e são temperadas com azeite, vinagre, ervas e sal, mas também com iogurte ou creme de leite (tipo creme fraisch). Há influências de outras cozinhas também: salada grega, caprese, mexicana com feijão e milho e asiática são feitas com os mais diversos legumes, frutas e folhas da estação.

Certa vez fiz um antepasto italiano de berinjela, abobrinha, pimentão temperados com cebola, alho e orégano, acompanhado de pão italiano, que me rendeu muitos elogios. Também tenho feito legumes e frutas na grelha, como os argentinos fazem. Novidade mesmo foi o abacaxi na grelha. Eles adoraram!

As festas de fim de ano ou de verão são os eventos que mais acontecem de junho a setembro: da escola, da escola de música, do esporte, do trabalho do pai, do trabalho da mãe… Você não vai encontrar ninguém que não tenha pelo menos três para ir!

Os organizadores pedem que cada um traga uma salada ou sobremesa para o buffet, seus próprios copos, pratos e talheres. No começo isso me causava estranheza. Foi-me explicado que é para diminuir a quantidade de lixo gerada pelos copos e utensílios de plástico e, claro, porque não tem ninguém que vai ficar para lavar a louça… Se vocês soubessem a quantidade de churrascos que acontecem nesses poucos meses, iriam concordar!

Em algumas festas a carne é vendida/servida pelo organizador. Porém há festas em que cada um precisa levar até sua própria carne, além das coisas mencionadas acima! Detalhe: o que você leva, você come. Nada de fisgar a linguiça do vizinho, não…

As carnes são assadas em conjunto na grelha

Há uma grande grelha redonda onde todos colocam seus pertences para assar. Já presenciei casos que os comensais colocam uma travessa de alumínio com furos em cima da grelha e a carne por cima da travessa, ao invés de colocar a carne direto na grelha (quem faz e aprecia um bom churrasco deve estar se contorcendo nesse momento….).

Porém quando fazemos churrasco em casa, fazemos do “nosso” jeito. Carne sul-americana não pode faltar, assim como a linguiça italiana, a farofa baiana e um arroz branco à moda brasileira. Eu já vi alemão “gemer sem sentir dor” com nossa carne temperada somente no sal grosso, preparada pelo meu marido, que é um churrasqueiro de mão cheia! Hummmm, já estou até com água na boca.

Churrasco a moda brasileira: frango no alho e linguiça merguês!

Aqui é natural se distribuir tarefas. Dificilmente há um evento em que não se tenha que levar nada, mesmo nos aniversários eles sempre oferecem uma contribuição. Esse é outro hábito que incorporei. Entre os brasileiros também já é assim, cada um traz uma salada, bebida ou sobremesa e no fim temos tudo que precisamos para um maravilhoso dia em conjunto.

Uma última informação útil: no mês de maio a “German Barbecue Association” promove o campeonato de churrasco! Eu nunca tinha ouvido falar disso no Brasil! O evento elege o Campeão Alemão de Churrasco do ano, título importantíssimo, não? É um evento para homens, onde só preocupa-se com a carne, como nos tempos das cavernas, como certa vez ouvi de um amigo vegetariano…

Curioso é que cheguei à conclusão de que fazer churrasco é coisa de homem mesmo. Churrasqueiro não pode se distrair (nem com a cerveja!) ou ficar batendo papo enquanto a carne está na grelha. Imagine a dificuldade para a mulherada tomar uma cervejinha, relatar sobre um milhão de coisas ao mesmo tempo e ainda ter que cuidar para a carne não queimar? É melhor preparar a salada antes…

Agora que você já sabe (quase) tudo sobre o grill alemão, desejo-lhe uma maravilhosa “Grillsaison”!

Copos Gigantes de Refrigerante Banidos da Cidade de Nova York

Um projeto de lei na cidade de Nova York está gerando bastante polemica aqui nos Estados Unidos. O prefeito da cidade, Michael Bloomberg, acaba de conseguir aprovar uma proposta para um processo experimental de três meses, que bane copos que comportam mais que dezesseis onças (16 oz) – o equivalente a 473ml, quase meio litro, de serem servidos nos restaurantes, bares, lanchonetes, lojas de conveniencia ou barraquinhas de rua da cidade. http://www.cnn.com/2012/06/12/justice/new-york-soda-ban/index.html

Copinho discreto de refrigerante facilmente encontrado nos Estados Unidos. Haja sede!

Um copo de meio litro de Coca-Cola me parece imenso, mas aqui a maioria das cadeias de lanchonetes tipo fast-food como McDonalds, e vários restaurantes, oferecem copos que comportam até quarenta e duas onças (42 oz), ou seja 1,250 litros, como porção individual de refrigerante, refresco ou cerveja.

Não foi sempre assim, as porções foram aumentando sistematicamente no país nos últimos quarenta anos. Na década de cinquenta as porções americanas eram equivalentes as porções brasileiras. Conforme mostra o gráfico no artigo do Huffington Post, The New (Ab)Normal Portion Sizes: Today x In The 50s http://www.huffingtonpost.com/2012/05/23/portion-sizes-infographic_n_1539804.html

Este prato do Cheese Cake Factory chama-se Chicken Bellagio, e é uma delícia. Mas como você pode ver é enorme, uma porção generosa de espaguete ao pesto, dois filés de frango a milaneza, prosciutto, e rucula. Eu dividi esta travessa com minhas filhas e todas comemos muito bem. Detalhe, esta é considerada uma porção individual.

Quando eu mudei para os Estados Unidos paguei vários micos até aprender a escolher o que pedir quando saia para comer. As porções consideradas individuais aqui são ridiculamente grandes, como vocês podem ver na foto ao lado, e eu aprendi a fazer uma coisa que não pega bem no Brasil, mas é perfeitamente aceitável aqui. Eu trago o que sobra de comida para casa. A não ser em restaurantes ultra sofisticados, que eu frequento esporadicamente, e que costumam ter porções mais razoáveis, a não ser os de menu fixo como o Per Se em Nova York, a grande maioria dos restaurantes aqui embalam o que não foi consumido para levarmos para casa. Na verdade eles estão tão habituados a isto que ao final da refeição, quando eles não perguntam se você quer caixinhas para embalar sua própria comida, eles mesmos embalam, e te trazem a sacolinha com o logo do restaurante cheia de caixinhas, com todas as sobras da sua refeição, junto com a conta. Na verdade, se você deixa bastante comida no prato e diz que não vai levar para casa, eles perguntam se há algum problema com a comida. Eu estou tão acostumada ao sistema que hoje em dia pego minha sacolinha e saio andando numa boa, no dia seguinte o almoço está garantido, nada de desperdício.

Esta fatia de bolo é gigante. Compartilhei este delicioso "Chocolate Fudge Cake", novamente do Cheese Cake Factory, com minhas duas filhas, de nove e treze anos que adoram doces, e ainda deixamos um quarto do bolo e do chantili no prato. E eu não quiz trazer o que sobrou para casa, o garçon ficou surpreso.

Outra coisa que eu também faço que já não é tão comum, surpreendentemente, é pedir um prato para compartilhar com as minhas filhas ou meu marido. As vezes pedimos apenas dois pratos e dividimos entre os quatro. Já causamos surpresa a vários garçons com esta prática.

No entanto uma grande parte da clientela realmente consome estas porções gigantescas em uma refeição. O que me faz compreender a iniciativa do prefeito de Nova York. O que ele diz é que não está proibindo ninguém de consumir quanta bebida açucarada quiser, mas que as pessoas terão que pedir mais copos para beberem 1.2 litros de Fanta, e quem sabe assim elas se conscientizarão da quantia que estão consumindo.

É claro que a Coca-Cola está em campanha contra a medida, e vários jornalistas estão dizendo que ela é contra a liberdade de escolha de cada um, quem não quiser beber tanto que não peça o maior copo, mas eu acho que ele está tocando num ponto real. Este copos gigantes viraram o padrão para muitos, que perderam a sensibilidade para o quanto estão consumindo.

A primeira vez que entrei num Starbucks levei vários sustos, primeiro eles servem café em copos e não xícaras, e o menor copo de café que eles servem chama-se tall – alto em inglês, e contém doze onças (12oz – 355ml) de café, ou qualquer das misturas que eles oferecem.  O menor café que eles oferecem é o short (8oz – 236ml), que não está no menu. Você precisa saber que existe para pedir, e eu não sabia. Joguei muito café fora até descobrir o short, e mesmo assim só vou ao Starbucks se tenho alguém com quem dividir um café. Ah, e eles só fazem bebidas quentes no tamanho short. Os cafés gelados, tipo frappés, são oferecidos somente de tall para cima, e vem com uma tampa redonda quase da altura do copo para conter o chantili, são bonitos de se ver. As outras porções oferecidas no Starbucks são: grande (16oz – 470ml), venti (20oz – 590ml), iced venty – venti com gelo (24oz – 710ml), e o espetacular trenta, tamanho exclusivo para cafés gelados (32oz – 946ml). Para colocar toda essa informação em perspectiva basta sabermos que a capacidade média do estomago humano é de 900ml como demonstra a ilustração no link do National Post: http://news.nationalpost.com/2011/01/17/graphic-how-big-exactly-is-starbucks-new-trenta-size/

O Starbucks passou a oferecer o tamanho trenta em 2011 para concorrer com lojas de conveniencia que oferecem copos de bebidas geladas entre 950ml a até o extraordinário volume de 1,9L. É realmente de impressionar.

Outra coisa que me espanta aqui são os baldes de pipocas vendidos nos cinemas, que vem, claro, com um gigantesco copo de refrigerantes. Até a porção infantil é enorme. Quando minhas filhas querem pipocas eu compro uma porção infantil para a família toda.

Baldinho de Pipoca

Num país onde mais de um terço da população é obesa (não fofinha, OBESA MESMO) – para detalhes cheque o link do Centers for Desease Control and Prevention (Centros para a Prevenção e Controle de Doenças) http://www.cdc.gov/obesity/data/adult.html, talvez Michael Bloomberg esteja no caminho certo.